Opinião - A contestável decisão da Justiça
Guilherme Kalel
Por Kester 10 G
11/08/2017
Nem sempre você expõe publicamente a sua vida, dentro de um portal de noticias se não for um caso de extrema necessidade.
Nem sempre você vai se atrever a analisar uma decisão que impacta diretamente a você e a sua família exclusivamente.
Mas as vezes isso se faz necessário, e é o que farei hoje.
Desde 2009, descobri um tumor cerebral contra qual uso os mais avançados tratamentos de combate através da imunoterapia.
Desde o começo, confiei nos médicos que fazem parte da equipe que cuida de meu caso, independente da situação que atravessasse.
Me lembro que as vezes as pessoas me perguntavam, por qual motivo não procurava um tratamento público, ou apoio do governo para custear minhas medicações.
A resposta era apenas uma, e bem objetiva.
Para me tratar via SUS, precisaria enfrentar uma longa fila, refazer todos os meus exames e ao final, seria colocado em quimioterapia, porque o setor público de saúde não dispõe das mesmas técnicas ou força de vontade da rede particular.
Então, tudo aquilo que meus médicos fizeram por mim ao longo dos anos estaria destruído e eu, eu não teria a mínima chance no final.
Além dos sofrimentos que causaria a mim e a minha família pelos efeitos catastróficos de uma quimioterapia, ainda veria a doença progredir cada dia e cada vez mais rápido, morreria num curto espaço e não estaria aqui os escrevendo hoje.
A análise é pesada, mas é bem realista. Muito difícil conhecer uma pessoa dentro de tratamentos no SUS, por mais que eles sejam bons, que chegue a 8 anos de doença da forma como eu cheguei.
Tenho naturalmente as minhas crises, sinto dores, tenho desmaios. Mas não perdi movimentos, ainda falo e tenho intacta a minha capacidade de pensar, sentir e reconhecer as coisas e as pessoas.
Tumores cerebrais são agressivos principalmente quando operáveis o que não era o meu caso, ou quando se entra em tratamento com quimioterapia.
Sempre tive essa convicção mesmo antes de conhecer mais sobre a doença, em que me tornei quase um especialista.
Mas depois de conversas e de 8 anos me tratando na rede Miccelann Clinicas em Ribeirão Preto e São Paulo, pude confirmar que estava certo e que os médicos também pensam como eu pensava.
Foi buscando minimizar os efeitos colaterais e as reações catastróficas do tumor, que eu iniciei desde o começo os tratamentos por imunoterapias, em diversos ciclos.
No caminho houveram momentos complicados e em alguns deles precisei usar a radioterapia.
Mesmo neste tratamento dito convencional, os médicos tiveram todo o cuidado de me preparar e de impedir efeitos colaterais indesejados.
As sessões eram feitas de modo alternado e usando equipamentos de última geração, com a chamada Radioterapia Localizada.
Tratamento de excelência sim, graças ao apoio de pessoas essenciais na minha vida.
Inicialmente com as amigas Helen Patrícia e Clarice Bueno, e depois com a parceria entre a Miccelann e o Grupo Kester.
Graças a isso, as pessoas que estão por trás dessas parcerias, estou aqui, recebendo um tratamento que gostaria muito que todos tivessem acesso.
O tempo foi passando, com problemas no coração desde pequeno naturalmente eles se agravaram ao longo do tempo.
Hora por causa do tumor cerebral, normal de se acontecer, hora por causa do Diabetes, que também tenho desde criança.
Mas o fato é que mesmo com as novas cardiopatias, mais uma vez as ações tomadas pela rede Miccelann, foram preponderantes para me manterem firme e de pé.
Passei por procedimentos, cirurgias a lêiser, tomei medicações, e tive acesso aos mais avançados exames e monitoramentos cardíacos.
Isso ainda faz parte do meu dia e agradeço por assim o fazer.
Mas outras coisas e desafios viriam pela frente.
Em março de 2017, depois de passar por uma cirurgia de emergência durante um curso em Porto Alegre, veio a descoberta.
Eu estava com uma infecção bacteriana e para a conter, era necessário usar um antibiótico bem caro.
Cada injeção custava entorno de R$ 375,00 e eu precisava de 10.
Demorou para que eu conseguisse recursos suficientes para tomar a medicação e isso fez a infecção avançar.
Mesmo tomando as injeções descobriu-se que pela demora, precisaria de mais medicação, e foi necessária outras 7.
Ao todo, foram 17 injeções e um tratamento que custou quase R$ 8 Mil.
Não fosse de novo, o apoio de pessoas importantes, amigos e parceiros como Laura, Keila, Mariana, e outros, não teria conseguido.
Mas eu consegui, tomei a medicação e conclui as injeções no final de julho.
O problema, não surtiram o efeito esperado.
A bactéria chegou ao sangue e provocou uma deficiência nos meus glóbulos vermelhos, responsáveis por me manter imune a outras infecções.
A bactéria continuava agindo e os médicos fazendo exames para detectar o que poderia destruí-la.
No começo de agosto o resultado, apenas uma droga no mundo seria capaz de deter a minha infecção e resolver o problema das células de meu sangue.
O problema maior é que a medicação é importada, produzida apenas na Europa e a única no mundo todo capaz de solucionar a enfermidade.
Precisava de tomar duas injeções por mês, durante um período mínimo de 24 meses conforme o receituário.
Cada injeção custa R$ 11 Mil, já convertido a moeda brasileira, por isso precisava de R$ 22 Mil mensais para a compra.
Infelizmente eu não sou rico, não tenho essa condição e não tive ainda como toma-la.
Foi a hora exata de seguir conselhos de anos antes, e procurar o governo para ajudar-me.
Estava errado.
Ingressei na Justiça pedindo que a União custeasse a minha medicação, para fazer todo o tratamento mínimo seriam necessários R$ 528 Mil, divididos em R$ 22 Mil por mês.
E o meu salário não é nem meio porcento disso, o que inviabiliza o medicamento.
Esperava e confiava, que a Justiça fosse deferir meu pedido, me dando o direito de continuar minha luta incansável para seguir em frente.
Me enganei, de novo.
Na quinta-feira, 10, o dia foi marcado ao seu final, pela negativa judicial em me conceder um benefício liminar para obter a medicação.
Para o Juiz, não ficou demonstrada a necessidade do uso da medicação citada, nem a necessidade da urgência da mesma.
Ele acredita que eu poderia esperar que o processo seguisse seu curso normal, e que se esgotassem todos os recursos para que só então, se eu vencesse, tivesse acesso ao medicamento.
Citou ainda o Magistrado, que para continuar com o processo, eu deveria passar por uma perícia médica com o perito judicial indicado.
Para que este pudesse dizer, se esta realmente é a única droga usada para o combate ao meu problema.
Escreveu o Juiz, que diante a situação grave na economia de nosso país, não poderia ordenar que a União custeasse meu tratamento de forma liminar, sem que antes
todas as provas fossem apresentadas e analisadas, porque isso abriria precedentes a que outras pessoas fizessem o mesmo.
E geraria um colapso na União que não teria recursos suficientes para pagar tratamentos médicos de todas as pessoas necessitadas ou que se achassem no direito de tal.
O Juiz ignorou os laudos médicos anexados a inicial do processo, cada parecer que explicava em detalhes por qual motivo necessito da medicação urgente, porque ela é a única usada para o problema, os médicos entregaram tudo prontinho.
Se quisesse uma segunda opinião ele poderia sim pedir, teria direito, mas não deveria de cara ter negado a liminar, ignorando os fatos que lhe foram apresentados.
A decisão cabe recurso, mas dificilmente as turmas recursais mudam decisões de primeira instância na esfera federal, exceção a casos muito desconexos com a realidade.
Ainda que recorra ao pedido negado, pode se levar um tempo considerável a analisar a nova liminar, e tempo agora é essencial para que eu possa ter o medicamento.
O Juiz que me negou o pedido liminar de acesso ao medicamento, não apenas me impede de acessar um tratamento.
Me impede de lutar com todas as armas possíveis dentro da medicina, para a minha recuperação de um problema que se não tratado pode levar a morte.
Pode por por terra, todo o processo longo, de 8 anos de tratamentos feitos e dedicados pela equipe médica da Miccelann.
Ele não nega o direito ao Jornalista Guilherme Kalel, em ter um tratamento necessário e urgente.
Mas cerceia o direito do cidadão Guilherme Rodrigues de Azevedo, pagador de seus impostos, contribuinte do Brasil, pai, chefe de família, brasileiro, de se cuidar e buscar a melhoria de sua saúde para a continuidade de sua vida.
Não é porque sou eu que escrevo indignado, fosse qualquer pessoa que estivesse em mesma situação, escreveria o mesmo.
Se no Brasil as coisas fossem tratadas de modo mais sério, se as instituições levassem as regras ao pé da letra, a situação não seria esta.
Infelizmente estamos condenados pela força de um sistema falho, a passar por momentos assim.
Senti, como eu sei que infelizmente muita gente sente, na pele o gosto de se cercear o direito, senti na pele, como sei que outros sentem, a injustiça da Justiça que
deveria como o nome diz, representar o justo, o correto, em todas e cada uma das situações.
guilherme@kester.net.br